Neuroze é alimento do autoritarismo
Pessoas estressadas são um prato cheio para
virarem massa de manobra política
virarem massa de manobra política
Tem muitos médicos que gostam de dizer que “os hormônios determinam a sua realidade”. Faz sentido. Muito do nosso bem-estar depende da saúde hormonal. No entanto, um aspecto pouco discutido sobre isso é que a questão hormonal não é um problema pessoal apenas, que fica na esfera do indivíduo. É um problema social. Ouso até a dizer que a saúde hormonal pode influenciar condições políticas e sociais de grande escala.
Um belo exemplo disso é o impacto das mídias sociais como moduladoras emocionais ao longo do dia. Há várias pesquisas científicas mostrando hoje uma correlação entre o uso recorrente de redes sociais e a busca por descargas de dopamina. A dopamina não é um hormônio, mas sim um neurotransmissor responsável por recompensar esforços motivados. Em outras palavras, é responsável pelo bem-estar que sentimos com relação a determinadas tarefas. A dopamina é liberada, por exemplo, quando recebemos elogios ou temos a sensação de que alguém nos observa com admiração.
Ora, as redes sociais são uma máquina de levar a esse tipo de sensação. O vício de tirar o celular do bolso inúmeras vezes ao longo do dia, para verificar se alguém deu “like” em algo que postamos, está intimamente ligado com a busca por dopamina. Quanto mais uma rede social consegue provocar essa sensação, mais “viciante” ela se torna.
Para além da dopamina, vale falar também no cortisol, conhecido como o hormônio do estresse. Ele é fundamental para diversas funções corporais. É também o hormônio que ativa a resposta do corpo perante situações de emergência. No entanto, como vivemos em um momento de múltiplas “emergências” o tempo todo, os níveis de cortisol para muita gente estão para lá de elevados.
Eleitor nervoso
Isso leva à clássica situação da pessoa “estressada”. Irritabilidade, transtornos de sono, dificuldade de relaxar e de pensar com calma e profundidade. Em outras palavras, a pessoa passa a viver uma vida de “visão em túnel” enxergando apenas o que tem na sua frente, perdendo a “visão periférica” que permite estar ciente do ambiente onde vive e dos aspectos mais amplos da sua vida. Em síntese, perde a capacidade de “self-awareness”.
E é exatamente esse tipo de situação que vem sendo explorada politicamente. Tem muitos grupos políticos que hoje medem o comportamento das pessoas na internet para determinar se a pessoa está estressada ou até mesmo neurótica. As pessoas estressadas e neuróticas são facilmente manipuláveis e são um prato cheio para virarem massa de manobra política. Pessoas nessas condições ficam especialmente propensas a aceitarem mensagens que estejam carregadas de sentimentos como medo, insegurança, raiva, autoridade e até mesmo violência.
Ouso dizer que há uma correlação entre os níveis de neurose em uma determinada sociedade com o avanço de correntes política extremistas, autoritárias e militaristas. Nesse sentido, além de todos os problemas que o estresse e a neurose podem trazer para o indivíduo, um dos fatores mais perversos está nessa perda parcial do livre-arbítrio.
Com isso, a questão hormonal (e do bem‑estar de modo geral) precisa começar a ser pensada do ponto de vista social, e não apenas individual. Pessoas sem estresse ou neuroses são mais inteligentes, empáticas, tomam melhores decisões e aprendem mais. São também mais caridosas e criativas.
Essas características irradiam-se positivamente pela sociedade (e pelas redes sociais). Em suma, um dos desafios para tirar o Brasil do buraco é reduzir a quantidade de neurose que circula entre nós.
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